Ao The Players' Tribune, Júlio César relembra ‘briga’ com Mourinho e maior decepção como rubro-negro

Ídolo do Flamengo, Júlio César publicou lindo texto no The Players' Tribune.
Ídolo do Flamengo, Júlio César publicou lindo texto no The Players' Tribune. / André Melo Andrade/Agência Eleven/Gazeta Press
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Se hoje Alisson e Ederson marcam presença em todos os debates sobre os melhores goleiros em ação no Velho Continente, em meados dos anos 2000, o Brasil tinha Júlio César como grande referência mundial na posição. Técnico, dono de um reflexo apurado e invejável tempo de reação, o carioca nascido e criado no Flamengo deixou o clube do coração rumo ao sonho europeu em 2005, movimento do qual não se arrepende, mas que poderia não ter acontecido à época. Quem garante isso é o próprio Júlio, em texto publicado originalmente no The Players’ Tribune:

“Não vou negar: o lado financeiro sempre pesou quando tive de fazer escolhas ao longo da minha carreira. Em 2005, o Flamengo me ofereceu um contrato dentro da realidade do clube naquele momento. Mas a Inter me fez uma proposta melhor, e eu aceitei. Se o Flamengo tivesse empatado com os números da Inter, eu teria ficado no clube? Sim, sem dúvida alguma”, contou.

Júlio César em ação pelo Flamengo, ainda em 2004, perto de concretizar sua saída para o futebol italiano.
Júlio César em ação pelo Flamengo, ainda em 2004, perto de concretizar sua saída para o futebol italiano. / FERNANDO PILATOS/Gazeta Press

Sentimento que veio de berço - seu pai e seus irmãos são torcedores do clube -, o amor do camisa 12 pelo Flamengo se fortaleceu ainda mais no tempo em que pôde vestir o Manto, mesmo que seus anos como profissional na Gávea não tenham sido de muitas alegrias esportivas. Isso, por sinal, é a grande frustração de sua carreira:

"Infelizmente, nunca conquistei um título de grande expressão com o Flamengo. Durante as quatro temporadas em que fui titular, entre 2001 e 2004, lutamos contra o rebaixamento em três anos. Cara, sofremos muito."

Júlio César
Júlio César nunca escondeu ser torcedor do Flamengo, mesmo na época em que ainda atuava.
Júlio César nunca escondeu ser torcedor do Flamengo, mesmo na época em que ainda atuava. / Thiago Ribeiro/Agif/Gazeta Press

Se os anos na Gávea não foram prolíficos, podemos dizer o exato oposto sobre seu período na Inter de Milão: foi na Itália onde vimos os melhores anos e a melhor versão do arqueiro, que venceu tudo e um pouco mais entre os anos de 2008 e 2010. O Scudetto de 2009, um dos títulos mais marcantes para o clube e para Júlio César, é narrado pelo goleiro por meio de um episódio curioso: uma discussão entre ele e José Mourinho. O motivo? O ‘Special One’ não queria liberar os jogadores da concentração no Hotel para a festa na Piazza del Duomo, local onde o clube sempre celebrava suas conquistas, mesmo com o título já confirmado matematicamente. 

“Mourinho continuou caminhando em direção ao quarto dele. Eu não iria simplesmente aceitar aquilo – fui atrás dele. Ele entrou no quarto. Eu também entrei. Quando ele deitou na cama, eu disse ‘Olha, se você não for para a Piazza, você nunca mais vai ganhar um título’. De repente, ele levantou da cama e começou a me xingar de tudo quanto é nome. Não tenho certeza, mas parece que ele levou a sério o que eu falei (...) Pouco depois já estávamos na praça, comemorando e cantando com a torcida. Chegou uma hora — eu estava muito alterado — e eu peguei o Mourinho pelo pescoço e disse ‘Então você queria ficar no hotel, né? Olha para isso! É para você!’ Ele caiu na gargalhada", relembrou.

FC Internazionale Milano Training Session & Press Conference
FC Internazionale Milano Training Session & Press Conference / Valerio Pennicino/Getty Images

Quatro anos depois de fazer a Tríplice Coroa pela Inter, Júlio vivia o total oposto das sensações que o esporte pode proporcionar: em um Mineirão abarrotado, sete finalizações da Alemanha passavam por ele e estabeleciam a maior humilhação da Canarinho em Copas do Mundo. Dizem que o tempo cura tudo, mas há feridas que teimam em não cicatrizar...

“Eu estaria mentindo se dissesse que é algo superado. Não tem como superar isso. Vou ficar marcado para o resto da vida por causa disso, ainda mais sendo goleiro. Mas o que eu posso fazer? Tenho de me reerguer. Isso passa por muito trabalho psicológico. Você precisa tentar olhar para frente. Hoje, graças a Deus as pessoas falam menos sobre isso, mas tenho de aceitar que aquele jogo nunca sairá de mim por completo. Nunca”, revelou.

7 a 1 já é ferida cicatrizada? Não para Júlio.
7 a 1 já é ferida cicatrizada? Não para Júlio. / Martin Rose/Getty Images

Do surgimento à despedida como jogador do Flamengo, passando por Inter, Chievo, QPR, Toronto e Benfica. Do Carioca de 1999 à Champions 2009/10. Do sonho da primeira convocação aos três Mundiais disputados. Uma carreira recheada de nuances, feitos e taças, que não pode jamais ser reduzida ao 8 de julho de 2014.